segunda-feira, 8 de maio de 2017

Texto octogésimo primeiro

Há circunstâncias em que a vida pára. Suspende-se, intemporal. Concentra-se toda naquele instante único em que se vive inteira. Quando nasce um filho, por exemplo. Ou uma filha, neste caso. Quando tu, há dezanove anos. Não foste a primeira, mas és tão – ou mais – importante por isso mesmo: és continuidade, renovação e diferença. Trouxeste-nos a noção de que a vida segue, de que os sonhos não cristalizam nas primeiras metas atingidas, mas reinventam-se sempre. Reafirmaste em nós a esperança de que tudo pode ser outra vez outra coisa e mais. Não poderias ser melhor, porque não podes ser outra, não poderás tornar-te pior, porque és tu mesma. Nasceste. Ocupaste entre nós um espaço que estava vazio sem que o soubéssemos, preencheste-o de uma forma que torna a tua ausência inconcebível. Como se sempre tivesses estado aqui. Surgiste do desejo inefável que nos habitava e deste-nos o tesouro da tua pessoa incomparável. Para nós, continuas a nascer todos os dias.
Há circunstâncias em que a vida pára. Suspende-se, intemporal. Concentra-se toda naquele instante único em que se vive inteira. E vale por isso. Tudo o que escrevi estava naquele momento em que tu, há dezanove anos. Desde então, continuo a viver esse momento, como uma eternidade estendida na finitude dos meus dias. Já eras em nós antes de existires e nós permaneceremos em ti quando já não formos. Porque és nossa filha. Porque tu.

Sem comentários:

Enviar um comentário